Seres
vivos que somos, nascemos e, eventualmente, morremos. Temos, portanto, início e
fim.
Tudo
ao nosso redor parece ter, também, início e fim. Os demais seres vivos, os
relacionamentos interpessoais, os dias do ano: vejam se tudo ao nosso redor não
começa e termina, de uma forma ou de outra (bem ou mal).
Talvez
em função disso (por estarmos acostumados com essa perspectiva de começo-término),
costumamos questionar sempre a origem e o fim das coisas, ponto de partida de
onde derivam as mais variadas perguntas, tais como: quando começou o Universo,
porque se iniciou a vida e quando terminarão todas as coisas... Essa é, afinal,
a tal perspectiva teleológica de Aristóteles.
Veja
que, para nós, seres humanos, é normal surgirem essas indagações, porque somos
seres finalísticos, sempre em busca de um objetivo e sentido em tudo. Afinal, tudo
que nós criamos tem, de uma forma ou de outra, além de início e fim, alguma
finalidade. Somos pragmáticos e é natural que procuremos por sentido para as
coisas. Mas... E se não há início nem finalidade para tudo?
A
reflexão que proponho hoje é: e se o Universo, de fato, não tem fim, nem
começo. E se ele apenas existe e sempre existiu sem qualquer razão subjacente?
Platão
dividia o mundo entre o sensível e o inteligível, isto é, entre aquilo que
nossos frágeis sentidos podem apreender e aquilo que, no campo das ideias, pode
ser idealizado (depurando a enganação dos nossos sentidos).
Em
função da fragilidade dos nossos sentidos, somos levados, habitualmente, a
conceber o Universo como produto necessário de uma relação causal, onde uma
causa gera uma consequência, onde há, necessariamente, um fim e um começo.
Ocorre
que essa visão é, como deixei entrever, essencialmente humana. Os animais
apenas existem. As pedras apenas rolam. O musgo cresce, indiferente, nas
paredes úmidas. A natureza parece não ter qualquer compromisso com objetivos.
Repare
que aquilo que, para nós, é a morte de uma planta, nada mais é, para a
natureza, do que a transformação de matéria em energia, de um ponto de vista
físico, ou uma sequência de reações químicas, de uma perspectiva química.
O
decesso de um ser vivo, para a natureza, não é seu fim, tampouco seu início. É
apenas uma parte de um ciclo maior, onde restam conservadas ao final, em
somatório, a matéria e energia envolvidas no processo.
Assim,
analisando a natureza sob o viés do inteligível, vemos que ela poderia muito bem
ser melhor representada por um círculo do que por uma reta, porquanto, ao
contrário da reta, ela parece não ter fim nem começo, bem com parece ser um
todo harmônico em constante transformação. E há uma lei da Física que demonstra
muito bem isso. É a lei da conservação da energia, segundo a qual, na natureza,
em um sistema fechado, nunca há perda de energia; ela apenas se convola em
outras formas de energia, conservando-se o quantitativo total envolvido no
processo. Isso acontece, por exemplo, quando a energia potencial de uma mola se
transforma em energia cinética.
Sendo
assim, abstraindo o raciocínio derivado da experiência humana, que é produto
desse limitado mundo sensível, somos levados a questionar que pode não haver,
propriamente, um fim (em ambos os sentidos) para as coisas, tampouco início.
Pode ser que as coisas, assim como nós, apenas existam e que todos e tudo sejamos
parte de um interminável ciclo, aparentemente harmônico, e regulado por regras
bem definidas, que simplesmente existem desde sempre.
Eu
não tenho a resposta para isso, nem pretendo ser capaz de chegar a ela na minha
insignificante existência. Talvez você, leitor, tenha as suas. Aliás, imagino
que cada pessoa, ainda que não reflita muito sobre isso, tem uma percepção
própria ou, ao menos, um feeling sobre essas questões. A princípio, não
considero tais noções incompatíveis com a existência de uma ordem superior, que
tenha estabelecido as leis físicas que regem nosso Universo, e que pode,
também, sempre ter existido. Muitos cientistas contemporâneos, inclusive,
compartilham dessa visão.
Talvez,
quem sabe, eu ou você possamos chegar a tais respostas em algum momento, lugar ou dimensão
(inclusive poderemos rir dessa nossa atual ignorância) ou
pode ser que simplesmente não sejamos dignos de tal conhecimento, assim como a
poeira abaixo do nosso sapato não tem ciência de quando será pisada. Afinal,
para os que não sabem, nesses últimos 12.000 anos, descobrimos não só que não
somos o centro do Universo, mas que somos parte de uma das centenas de milhares
de espécies de seres vivos que já moraram em um pequeno planeta que orbita uma
pequena estrela, numa zona absolutamente periférica de uma dentre bilhões e
bilhões de outra galáxias em um Universo aparentemente em expansão.