segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Dia comum no Juazeiro



Pelas frestas da janela, por meio da pequena circulação de ar que passa pela empoeirada persiana, estou atento aos barulhos da vizinhança. Passei os processos rosa para um lado e me debrucei sobre os verdes. Penso: “esses merecem maior atenção”.

Surgiu-me uma dúvida e, ao divagar sobre a resposta, perdi o foco. Não está funcionando a internet e estou sem acesso à consulta do CJF. Peeen

Volto minha atenção à rua. Observo que o barulho vem de crianças em disputas de bola ou no habitual corre-corre. Curiosamente se tratam apenas por apelidos. Não distingo os prefixos, somente os “inhos”. Um deles brinca com um daqueles antigos caminhões de madeira. Senti saudade, embora não lembre de ter tido ou tocado em um.

Além disso, somente aqueles rangidos das velhas cadeiras de balanço. Na outra esquina, um senhor com a perna enfaixada balança ao sabor do vento. Não parece preocupado com o que se passa na Vara ao lado. Também não parece estar preocupado com qualquer outra coisa. Parece contemplativo e indiferente.

Reflexões de Drauzio Varella permeiam minha mente. Não creio ser recomendável ou prudente exposição solar no calor outubrino do Vale do São Francisco. Não creio, contudo, que ele esteja se importando. Penso que deve ser acostumado com o calor por ter sido trabalhador rural e, agora, provavelmente, aposentado. Conclusão curiosa. Ri internamente.

Lá embaixo as pessoas circulam para lá e para cá com papéis na mão e exames, embora não se trate de clínica médica. Alguns parecem apreensivos. Devem estranhar o portal de detecção de metais comandado por Alberto. Outros entram com aquela expressão de qualquer cidadão que entra em repartição pública: cara de quem está tentando entender onde e como se resolve o que se quer resolver e tentando descobrir se vai demorar.

Nesse meio tempo, Seu Francisco irriga o gramado e diz lá de baixo: “Doutor, ainda bem que a grama é pouca, imagina o tanto de água para aguar esse terrenão todo”. Respondo: “verdade, Seu Francisco”, embora desejasse que a área fosse toda gramada. Penso: “Ele está certo ao considerar o cenário de crise”.

Ao voltar minhas atenções aos meus afazeres... Toc toc.
Dona Geraldina entra no recinto pontualmente, como de costume, e pergunta: “Cházinho?”. A pergunta é quase retórica. Não lembro de ter declinado alguma vez.

Levanto o pires da xícara e escorre a água que havia condensado em sua superfície. Resmungo para mim mesmo: “todos os dias molho esta mesa.” Enxugo com as folhas de decisões que ia proferir, mas não proferi. Rascunhos que certamente traçariam um destino diferente para os envolvidos. Conforto-me: “espero ter acertado ao modificar”.

Cuido das minhas responsabilidades. Passa o tempo. Almoço ao lado e retorno para a Vara. Mais processos. Cadastros. Advogados desejam despachar. Ana me intercepta no corredor com algumas pendências. Após ouvir, me tranquilizo. “Dá para resolver”. Waldner liga pelo ramal e diz que está subindo para tratar da pintura da Vara com Zé Nilton. Allan, Célia, Fábio e Francisco têm dúvidas sobre despachos. Gérson está com Lorena e Chaislan organizando a pauta de audiências. Aldo tenta instalar a versão nova do Google Chrome para acessar mais um cadastro de informações. Chagas me diz ter uma precatória de medicamentos urgente para assinar. Chico fala sobre uma RPV. Abro o processo e vejo que Candice, Chico e Ernesto cumpriram os mandados em endereços diversos do executado. Itinerância interessante. Sobem os expedientes de distribuição de Zenóbio. Recebo um e-mail de Jacqueline. Emoticon no final? Check. Catarina e Carol trazem boas soluções para alguns problemas. Pondero, concordo e digo: podem fazer assim. Juliana, Rosa e Pedro deixam processos na sala.

No final do dia, escuto ao fundo Kedes comentando algo engraçado. Nem sei o que foi dito, mas escuto Cris, Andréa e Zineide rirem. Fecho o portão de acesso à escada. Despeço-me.

Dona Amélia me dá o tradicional: “até amanha, doutor”.  Ao abrir a cancela do estacionamento, o guarda me presta uma gentil continência. Mesmo não sendo militar, devolvo, por cortesia, e digo: “bom descanso, Capitão”. Encerrado o expediente em Juazeiro.

 FBX



Nenhum comentário:

Postar um comentário