quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Devaneios Profissionais


Para quem não sabe, a carreira burocrática nem sempre foi minha primeira opção. Já tive devaneios profissionais esportivos, científicos e artísticos.

Comecei muito cedo no esporte amador estudantil. Primeiro no futebol da escola. Na verdade, nunca fui um centro-avante talentoso. Acredito que sempre era escalado pelo “professor” porque sempre fui um jogador raçudo, embora não tivesse, propriamente, habilidade no trato com a bola. Era e sou um jogador de futebol limitado, mas com um jogo bastante pragmático, sem muitas firulas. Considero-me cônscio das minhas limitações, talvez por isso nunca costumava inventar muita coisa. Jogava o feijão com arroz e, geralmente, dava certo.

Aos 10-11 anos tive uma experiência de quase ascensão profissional abruptamente interrompida pela dificuldade de comunicação da época. O time infantil do clube francês Lyon havia chegado na cidade para jogar contra meu time do colégio, para uma possível prospecção de novos atletas. Ocorre que era período de férias e estava numa pescaria com um dos meus tios e primos. Não havendo, ainda, celulares, acabei não recebendo, por ausência de meios tecnológicos, a mensagem do mestre Jaílson com o local e horário da partida.

Embora tenha sido, no momento, uma experiência frustrante, depois de alguns dias concluí, na minha praticidade infantil, que, definitivamente, não seria importado pelo futebol francês. Acabou não fazendo diferença.

Após uma temporada no banco de reservas que começou a se eternizar, acabei migrando para o judô. Nesse esporte me considerava melhor. Aprendi muito rápido os golpes e cheguei a obter razoáveis colocações nos campeonatos locais. Provavelmente deve haver medalhas em alguma gaveta na casa da minha mãe.

O futuro na carreira do judô, todavia, era incerto. Embora já tivéssemos o ouro olímpico de Aurélio Miguel, não parecia, aos olhos de uma criança geralmente prudente, uma escolha que levaria a uma trajetória de sucesso. Logo desencanei, portanto, dessa ideia.

Nesse meio tempo, assisti a uns clássicos de ficção científica, como “2001: Uma Odisséia no Espaço” e “Apollo 13” e flertei, puerilmente, com a possibilidade de participar, profissionalmente, de uma viagem interestelar. Essa meta, contudo, foi frustrada por limitações científicas (como a impossibilidade de a matéria, em geral, viajar na velocidade da luz) e pela precária condição do programa espacial brasileiro dos anos 1990. Tive que me adaptar à realidade.

Dos dois primeiros devaneios profissionais (repetindo, esportivo e científico), somente restou, agora, o interesse por esportes de menor intensidade física, como o tênis, e a curiosidade por assuntos científicos e filmes relacionados ao tema.   

O último devaneio, o artístico, contudo, é mais severo. Tenho um grande gosto por música e instrumentos musicais, o que me rende piadas infames dos familiares e amigos mais próximos. Dizem não saber qual instrumento, de fato, eu toco. Tenho ou já tive os seguintes instrumentos musicais: violão, guitarra, triângulo, repinique, gaita, bateria, cavaquinho, piano, sanfona e, por último, ukulele. Não que eu saiba tocar todos bem, longe disso. Tenho maior conhecimento no violão, bateria e piano, mesmo assim, não creio ter talento musical que pudesse me garantir o sustento (se bem que hoje em dia não é bem um requisito).

Já integrei uma banda de forró pé-de-serra com primos e uma banda de rock com colegas de trabalho. Adianto que nenhuma delas teve qualquer disco lançado ou se apresentou para um público superior a 200 pessoas. Ganhamos, com a primeira, no entanto, um mini festival na faculdade, o que nos envaidece até hoje. Na verdade, acho que ganhamos mais pelo carisma e animação do que, propriamente, pela técnica. Azar deles.

O fato é que ingressei nas atividades artísticas já mais tarde e mais velho e, portanto, menos suscetível a devaneios. Avalio, ainda, agora, que, se tivesse optado por essa via mais cedo, provavelmente não encontraria suporte em casa. Minha mãe, na sua objetividade, certamente diria: “Meu filho, não acho que você tenha talento suficiente”. Risos. Também não consigo me vislumbrar como uma daquelas crianças sem talento que vão a programas de auditório levadas pelos pais para constituírem elementos de prova que deponham contra sua reputação futura.

Pelo bem ou pelo mal, ao tempo do devaneio, meu espírito auto crítico já havia aflorado ostensivamente e não me permitiu sucumbir a esse desejo renitente.

Hoje avalio como acertada a escolha, o que não me impede de achá-la equivocada de vez em quando, somente para, no dia seguinte, mudar de ideia de novo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário